O Ciclo Completo de Polícia

Está em discussão no Congresso Nacional o chamado Ciclo Completo de Polícia; mas o que é um Ciclo Completo de Polícia? É mais uma distorção do Modelo Policial Brasileiro.




Já tivemos a oportunidade de discutir em um de nossos posts que o nosso legislador constituinte jogou para os Estados o ônus da denominada Polícia de Segurança Pública, que são aquelas polícias que cuidam do dia-a-dia da vida da sociedade, fazem o patrulhamento regular e apuram os crimes cometidos entre cidadãos além de outras atividades de proteção e controle social.
Porém para a infelicidade da sociedade, ele criou um sistema de duas meias polícias, fazendo uma a polícia ostensiva e a outra a polícia judiciária, o Inquérito Policial; isso em nível estadual, o que também é uma inovação, que explicaremos mais tarde.
Mas esse Modelo que foi esculpido em nossa constituição já era o anteriormente praticado desde pelo menos 1941, quando entrou em vigor nosso Código de Processo Penal, que em nenhum momento prevê essa dicotomia de funções. Os estamentos policiais dos estados começaram a fazer essa divisão por si só!
Foi a partir da Emenda Constitucional Nº1 de 1969, que extinguiu todas as polícias fardadas do Brasil - haviam várias naquela época - e as unifica com as já existentes Polícias Militares, mantendo as Polícias Civis; ficando de certa forma estabelecido que onde houvesse a Polícia Civil - elas não existiam em todos os Municípios, como não existem até hoje - era sua a competência de apurar as infrações penais através do Inquérito Policial e, onde não houvesse, policiais militares fariam essa função, já que não há proibição no Código de Processo Penal.
Com a Constituição de 1988, o artigo 144 consagra de vez esse modelo de duas meias polícias, cada uma com uma função e amarra a apuração das infrações penais às Polícias Civis, mesmo sabendo que elas só estão presentes em 20% dos Municípios brasileiros, sendo certo que isso representa horas e horas de deslocamento nos rincões de nossas Regiões Norte, Nordeste e Centro-oeste.
Você deve estar se perguntando o por quê deste blogueiro afirmar que isso é uma invenção brasileira? Porque simplesmente não existe essa coisa de Ciclo Completo de Polícia em qualquer lugar do mundo, o que se tem sim é Ciclo de Polícia ou Policial e Ciclo de Justiça ou Judicial.
O Ciclo Policial envolve tudo o que a polícia faz: o patrulhamento, o atendimento ao público, o atendimento aos chamados de urgência e emergência e a investigação penal.
O Ciclo Judicial é aquele que tem início com o envolvimento do Promotor de Justiça e do Juiz no processo, seja pelo encaminhamento do apurado em determinado delito, seja pela apresentação a eles nos casos de flagrante.
O que ocorre com muita frequência é o desenvolvimento concomitante dos dois ciclos, onde a polícia passa, em conjunto com a Promotoria e até mesmo com o Juiz, a investigar e apurar certos delitos, em especial os mais violentos e de grande relevância.
Pelo exposto, é ilógico a discussão sobre Ciclo Completo; entretanto é o Sistema que temos, e precisamos buscar a melhor solução dentro dessa nossa realidade, vez "que não se dá cavalo de pau com transatlântico", não é mesmo?
A situação mais cômoda e adequada para todos os Órgãos envolvidos seria essa:

1. Nível Federal:

Todas as polícias teriam seu Ciclo de Polícia integral, pois a lógica da Constituição para esses Órgãos é jurisdicional, portanto não há invasão alguma de competência nem competição institucional, já que atuam em áreas completamente diferentes.

2. Nível Estadual:

Às Polícias Militares a competência para a elaboração dos chamados Termos Circunstanciados de Ocorrência (TCO - previstos na Lei 9.099/95) nas Contravenções Penais e naqueles Crimes definidos como de "Menor Potencial Ofensivo", que constituem cerca de 90% de tudo quanto de delitual ocorre e que não dependem de investigação e são conduzidos diretamente ao juiz por força de lei.
Às Polícias Civis a apuração penal dos demais crimes, que embutem uma maior complexidade, desafogando-se dessas pequenas infrações que oneram os modestos recursos dessas instituições.

3. Nível Municipal:

Conceder às Guardas Municipais, dentro de suas atribuições constitucionais, a competência para também lavrarem o TCO, o que emprestaria mais autoridade a essas instituições.
No caso, para explicar melhor, as Guardas poderiam elaborar o TCO naquelas ocorrências onde se verifica o cometimento de uma Contravenção Penal ou Crime de Menor Potencial Ofensivo numa escola ou pronto-socorro do município, numa praça, cemitério ou em qualquer lugar cuja administração esteja a cargo do Poder Público Municipal.
É claro que haveria situações de competência concorrente entre a PM e a GM, mas nada que não se possa resolver com lógica, urbanidade e boa vontade.

Espero amigos ter jogado um pouco de luz sobre esse tema, sendo certo que não entendemos que esse mecanismo de Ciclo de Polícia necessariamente passe pela diminuição de poder, ou de extinção de qualquer Órgão Policial; porém uma coisa é certa: a sociedade tem muito a ganhar com isso e a sensação de impunidade será bem menor nesse nosso tão sofrido Brasil.

Para um próximo post deixo essa pergunta: Você conhece em países organizados federativamente estados que têm mais de uma polícia?

Abraço a todos e até!

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